quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Bloco de Esquerda questiona Secretário de Estado da Cultura sobre abandono do património histórico mineiro de Rio Maior

Catarina Martins
Catarina Martins, deputada do Bloco de Esquerda na Assembleia da República, esteve em Rio Maior onde visitou o antigo complexo mineiro do Espadanal e teve uma reunião com a associação EICEL.
Quatro dias depois, dirigiu ao Secretário de Estado da Cultura a seguinte pergunta:

"Em visita do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda ao complexo mineiro do Espadanal, no passado dia 10 de Dezembro, foi, lamentavelmente, evidente o abandono a que o complexo está votado e, mais ainda, foi possível constatar a utilização deste património histórico industrial, pela própria Câmara Municipal de Rio Maior, como depósito de resíduos e materiais de construção a céu aberto e sem qualquer vedação, a apenas 50 metros de um estabelecimento de ensino do 1º Ciclo, o Centro Escolar N.º 2 de Rio Maior. A protecção deste importante património é, portanto, da máxima urgência, tanto para evitar a sua completa destruição, como para garantir a segurança pública.


A exploração da Mina do Espadanal, no concelho de Rio Maior, transformou de forma relevante e perene as estruturas demográfica, social, económica, urbana, cultural e desportiva da sede do concelho, particularmente nas décadas de quarenta, cinquenta e sessenta do século XX, contribuindo de forma decisiva para que a então Vila de Rio Maior ganhasse dimensão para atingir o estatuto de cidade que hoje detém.

A importância histórica e arquitectónica do património mineiro do concelho de Rio Maior foi reconhecida em Pareceres emitidos pelo antigo IPPAR, pela antiga Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN), e pela Sociedade Espanhola para a Defesa do Património Geológico e Mineiro (SEDPGYM), defendendo de forma unânime a necessidade da sua classificação, e através da inventariação pela Ordem dos Arquitectos no Inquérito à Arquitectura Portuguesa no Século XX (IAPXX).


O “valor simbólico e identitário da fábrica de briquetes para Rio Maior” foi também reconhecido pelo então Ministério da Cultura em resposta a um requerimento de um deputado do Grupo Parlamentar do PCP à Assembleia da República, em Setembro de 2007.


A nível académico, o valor histórico e cultural deste património já foi realçado e fundamentado pelo professor Ivan Carlos Costa, na sua dissertação de Seminário Científico-Pedagógico, no âmbito de Licenciatura em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e publicada pelo jornal Região de Rio Maior, em 1999/2000, intitulada “As Minas de Lignite de Rio Maior e sua importância socioeconómica para a região e para o país”, e pelo arquitecto Nuno Alexandre Rocha, na sua tese de Mestrado em Arte, Património e Teoria do Restauro, defendida, em Maio de 2011, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, sob o título “Couto Mineiro do Espadanal (Rio Maior). História, Património, Identidade”.


No dia 8 de Agosto do corrente ano de 2011, foi apresentado pela EICEL 1920, Associação para a Defesa do Património Mineiro, Industrial e Arquitectónico, um pedido de abertura de procedimento administrativo tendo em vista a Classificação do conjunto edificado composto pela antiga fábrica de briquetes e plano inclinado de extracção da Mina do Espadanal, sito em Rio Maior, enquanto Património de Interesse Municipal, nos termos da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, e do Decreto-lei n.º 309/2009, de 23 de Outubro. Mas este pedido foi indeferido pela Câmara Municipal de Rio Maior em reunião ordinária realizada a 11 de Novembro de 2011.


Contrariando todos os pareceres existentes, a Câmara Municipal de Rio Maior não procedeu à avaliação dos critérios genéricos de apreciação das formas de protecção legal do património definidos pelo artigo 17º da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro, a saber: “Para a classificação ou a inventariação, em qualquer uma das categorias referidas no artigo 15º (imóveis de interesse nacional, imóveis de interesse público e imóveis de interesse municipal), serão tidos em conta algum ou alguns dos seguintes critérios: a) o carácter matricial do bem; b) o génio do respectivo criador; c) o interesse do bem como testemunho simbólico ou religioso; d) o interesse do bem como testemunho notável de vivências ou factos históricos; o valor estético, técnico ou material intrínseco do bem; f) a concepção arquitectónica, urbanística e paisagística; g) a extensão do bem e o que nela se reflecte do ponto de vista da memória colectiva; h) a importância do bem do ponto de vista da investigação histórica ou científica; i) as circunstâncias susceptíveis de acarretarem diminuição ou perda da perenidade ou da integridade do bem."


Na sua fundamentação do indeferimento, a Câmara Municipal de Rio Maior apresenta interpretação própria do acto de classificação restrita a um único critério de “medida meramente preventiva, quando em presença de uma situação de perigo de perda de um património ou sítio”. Esta interpretação restritiva é inexistente no articulado da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro.


Reunião com a EICEL
Em oposição à proposta de classificação apresentada pela EICEL1920, a Câmara Municipal de Rio Maior alega, contrariando o conceito de protecção legal do património consagrado na Lei nº107/2001, de 8 de Setembro, que “o início de um processo e posterior classificação de um sítio implica uma série de condicionantes que, regra geral podem constituir mais um entrave que um apoio na gestão do património.”

Em declarações à Agência Lusa proferidas no dia 30 de Novembro, a actual presidente da Câmara Municipal de Rio Maior acrescentou que a classificação “não é oportuna neste momento, porque não podemos inviabilizar projectos de alguns proprietários instalados nas imediações”.


Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Secretário de Estado da Cultura, as seguintes perguntas:


1. Tem o Governo conhecimento da interpretação que a autarquia de Rio Maior faz sobre a Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, de que “o início de um processo e posterior classificação de um sítio implica uma série de condicionantes que, regra geral podem constituir mais um entrave que um apoio na gestão do património”, e restringindo a sua aplicação apenas “como medida meramente preventiva, quando em presença de uma situação de perigo de perda de um património ou sítio”? Concorda com esta interpretação?


2. Não considera o Governo que a recusa de classificação de património para protecção de interesses individuais de proprietários privados é incompatível com a Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, bem como com o exercício da defesa dos interesses de uma comunidade previsto pelo artigo 235º da Constituição da República Portuguesa?


3. Tem o Governo conhecimento que o complexo mineiro do Espadanal está a ser utilizado como depósito de resíduos e materiais de construção?


4. Pondera o Governo, na sequência dos pareceres da tutela do património cultural sobre esta matéria, dialogar com a autarquia de Rio Maior no sentido de encontrar os mecanismos necessários para a salvaguarda e valorização do complexo mineiro do Espadanal?"

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